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Resenha - “Lélia Gonzalez e a categoria político cultural de amefricanidade”, por @umapretaensinou

Confira a resenha do texto publicado em 1988 por Lélia Gonzalez, líder ativista, pesquisadora, professora e grande referência no movimento negro brasileiro

Resenha - “Lélia Gonzalez e a categoria político cultural de amefricanidade”, por @umapretaensinou
Resenha - “Lélia Gonzalez e a categoria político cultural de amefricanidade”, por @umapretaensinou (Foto: Reprodução)

Lélia Gonzalez uma grande referência para os movimentos negros no Brasil e no mundo. Líder ativista, pesquisadora, professora na PUC/RJ, foi do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher, vice Presidente da Associação Internacional do Festival Pan-africano das Artes e Cultura (Senegal) e do Congresso Mundial de Intelectuais Negros (Estados Unidos). 


Publicou "A categoria político-cultural de Amefricanidade" em 1988, o ano em que foi promulgada a Constituição Federal no Brasil, nesta época estava sendo discutido sobre os direitos da população e a regulamentação das politicas de Seguridade Social como o SUS na política de saúde, a instituição de uma política de assistência social juntamente com a de previdência social. Lélia propõe uma categoria político-cultural de análise do racismo como uma tecnologia colonial que fortalece o imperialismo. Escreve também sobre a complexidade da identidade negra no Brasil e nos demais países colonizados. 


Em 12 páginas traz elementos da história, cultura e política na construção da amefricanidade - um conceito que vai além de fronteiras geográficas para falar da diáspora africana nas Américas. 


Desafiando as narrativas hegemônicas que fortalecem a invisibilidade e a marginalização da história de pessoas negras levadas dos diversos lugares de África para serem escravizadas em colônias, a autora pontua influências culturais dessas pessoas em nossa língua e nas formas de vida no Brasil ao ponto de sermos uma América Africana. 


Como exemplo, apresenta o termo: “pretuguês” para representar a influência dos negros em diáspora* na língua dos colonos, o português. Essa influência é tão forte que no Brasil temos diversas formas de sotaques, expressões, gírias e dialetos variados em relação ao português falado no Brasil, variando de acordo com a região. 


Ela destaca como a amefricanidade é uma expressão de resistência, enraizada na luta do povo negro por dignidade, reconhecimento e justiça e principalmente a retomada da influência histórico-cultural dos povos não brancos. 


Ao longo do texto, ela explica a categoria político-cultural de amefricanidade, explica que sua origem vem desde os horrores da escravidão e permanece  nas lutas atuais por direitos dos povos negros que passaram pela colonização. Ela explica a diferença de como o racismo, como uma tecnologia de dominação, foi utilizado por diferentes países colonizadores da Europa.  


Destaca também a importância de celebrar e valorizar as contribuições culturais, intelectuais e políticas dos negros em diáspora, reafirmando sua humanidade e influências culturais no mundo. Com uma sensibilidade aguçada, Lelia nos conduz por um caminho de reflexão sobre o imperialismo e as Américas, questionando por que apenas estadunidenses - inclusive o povo negro - se autodeclaram AMERICANOS, sendo que as Américas são formadas por sua diversidade, afinal nós da América Latina também somos americanos. Lélia aponta esse apagamento e propõe o reconhecimento de uma AMÉFRICA LADINA, nos convidando para reconectarmos com nossas raízes africanas diversas e a abraçar nossa herança indígena. 


Sua escrita é direta e ela explica as diferentes formas de racismo - aberto e disfarçado - o racismo aberto se reproduz através da ideia de que “negra é a pessoa que tem antepassados negros” e em sociedades que negaram a miscigenação, um exemplo é a lógica do racismo nos Estados Unidos em que as comunidades se dividem pela raça, chegando a ter bairros declarados de comunidades negras, latinas e brancas por exemplo. 


Já nos países latinos, como o Brasil, em que a miscigenação foi mais intensa, temos o racismo disfarçado, que apesar de ser tão violento quanto o racismo aberto, se disfarça a ponto de naturalizar a violência, dando a impressão de que sempre esteve presente na sociedade, tendo seu apoio em categorias falsas como a democracia racial. Aqui, o racismo vai depender dos traços físicos que são os marcadores da raça, logo a textura do cabelo, a cor da pele e largura do nariz por exemplo, vão ser considerados na classificação racial, independente das origens consanguíneas. 


 "A categoria político-cultural de Amefricanidade" é um artigo de grande importância e impacto para comunidade e movimentos negros. É uma construção poderosa da visão e do legado de Lélia Gonzalez, cuja voz continua a ecoar como inspiração para as gerações futuras de pesquisadoras negras.


*Negros em diáspora: descendentes de africanos que foram escravizados e levados para fora do continente africano durante o período da escravidão transatlântica.

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